domingo, 9 de dezembro de 2012

A Fisiologia no Mundo dos Insetos



Os insetos e seu sistema endócrino

Os insetos são os animais mais diversos do planeta sendo encontrados em praticamente todos os ambientes: em meio terrestre e aquático, em locais quentes e gelados. Promovem muitos benefícios para os seres vivos, em especial os humanos, pois são responsáveis (na maioria dos casos) pela produção de frutos utilizados como fonte de alimento para diversos animais. Ao utilizar as flores para alimentação e ‘recursos’ para a proteção dos seus ninhos (pólen e óleos), os insetos promovem a reprodução e dispersão de muitas espécies vegetais. Em muitos casos, a reprodução das plantas depende intimamente dos insetos e vice-versa.
Para todos os seres vivos, o sistema endócrino é responsável pela produção de hormônios a partir de glândulas. Nos insetos, é encontrada a partir da secreção nos centros neurais de substâncias químicas sinalizadoras que atuam em um local distante do que foi produzido. São estas substâncias que diferenciam um inseto em suas várias fases, desde a muda até quando indivíduo o se torna adulto, apresentando corpo alado e chegando a sua reprodução.  Em cada fase, um hormônio especifico irá atuar para promover as diferenças morfológicas nestes indivíduos.

 
Figura 1 - Representação dos hormônios produzidos pelos insetos para cada fase de seu ciclo de vida. 

    Na ecdise (muda) a atuação do hormônio protoracicotrópico (HPTT) é fundamental para que haja o desprendimento do exoesqueleto do corpo do animal; este composto é transportado através da hemolinfa (sangue dos insetos) por meio de glândulas protorácicas até seu receptor periférico. Na fase juvenil, o hormônio apresenta um papel importante na modificação e especificidades da morfologia (interna e externa) do inseto, juntamente com os ecdisteróides; toda a ação é comandada por neuropeptídeos.

Figura 2- Representação do sistema nervoso de um inseto. Os gânglios nervosos são responsáveis pela transmissão das sinapses para todo o organismo dos insetos.
Esses invertebrados podem gerar conflitos com os humanos, pois muitos deles buscam seus recursos em áreas antropizadas causando doenças, visto que esses animais são vetores de certas enfermidades como a dengue.
Na tentativa de promover um combate eficiente aos insetos considerados pragas em muitas atividades agrícolas, o ser humano desenvolveu métodos químicos como uso de inseticidas e defensivos agrícolas que podem ser facilmente utilizados e de rápida ação deletéria a grande parte desses animais. O grande problema é que, em curto prazo, o uso indiscriminado desses agentes químicos pode parecer satisfatório, porém, quando se realizam estudos em longo prazo, observasse que nem para a economia e muito menos para a saúde, esse uso é bom e tem criado sérios riscos.
Figura 3 -  Receptores  de GABA, mostrando os sítios dos canais de Sódio e Cloro. Cada receptor apresenta compostos específicos de encaixe.
Os mecanismos de ação dos inseticidas ainda não são totalmente esclarecidos, porém pode-se associá-los a alguns processos que ocorrem no sistema nervoso desses animais(Figura 2). Dentre as formas de atuação, é possível que os inseticidas ajam nos receptores sinápticos imitando os neurotransmissores e ligando-se aos receptores, de GABA - neurotransmissor presente no sistema nervoso central, por exemplo (Figura 3). No caso do nosso exemplo, isso resultaria na morte do inseto pela hiperexcitação, provocada por cessamento de entrada de Cl- na célula, ou poderia inversamente, estimular a entrada excessiva de Cl- no axônio resultando na morte do inseto por bloquear a transmissão de sinal nervoso e posterior paralisia total.
Ao passar por essa pressão seletiva, os indivíduos podem adquirir resistência ao tratamento, aplicado de forma errônea, alterando sua fisiologia. Ao ser utilizado um inseticida, por exemplo, parte da população morre e aqueles que sobrevivem podem gerar descendentes menos vulneráveis aos efeitos dos inseticidas. Aplicando inseticida nessa geração, menos indivíduos morrerão do que na geração parental e mais indivíduos resistentes serão gerados, chegando a um ponto que o tratamento não produza mais efeitos sobre a população de insetos da área.
A ação não letal dos inseticidas pode estar ligada ao tipo de revestimento do corpo desses animais. Os insetos possuem o esqueleto externamente (exoesqueleto), com uma camada chamada cutícula, contendo quitina. Dependendo da espessura e da composição química dessa cutícula, a quantidade de inseticida que irá penetrar no corpo do inseto pode variar. Alterações em determinados canais, sítios de ligação dos inseticidas nas células, também podem estar associados à redução da ação neurotóxica  desses compostos, a exemplo do canal de sódio que, ocorrendo uma mutação, pode mudar a conformação e não permitir a ligação desses compostos nos canais; o fluxo de sódio permanecerá normal e o organismo continuará vivo.

 

Um alerta: cuidado com os disruptores endócrinos

Nesse contexto do uso de defensivos agrícolas e inseticidas, surge uma questão de saúde pública, que não é muito debatida na mídia e que provoca sérios problemas na natureza: o uso dessas substâncias químicas pode perturbar o sistema endócrino dos seres humanos e de outros animais e são conhecidas por desruptores endócrinos.
 Desruptores endócrinos são por definição da Agência de Proteção Ambiental (Environmental Protection Agency – EPA), “agente exógeno que interfere com síntese, secreção, transporte, ligação, ação ou eliminação de hormônio natural no corpo que são responsáveis pela manutenção, reprodução, desenvolvimento e/ou comportamento dos organismos”. Sendo assim, essas substâncias podem afetar seriamente o corpo dos animais e se acumulam facilmente na natureza, pelo fato de serem utilizados de qualquer jeito e resistir por muito tempo (eles se acumulam no solo e na águas, por exemplo).
Seus mecanismos fisiológicos de ação são variados e uma das possíveis explicações biológicas é a desregulação dos processos de sinalização celular, em que essas substâncias ligam-se aos receptores dos neurotransmissores e bloqueiam a ação dos hormônios que seriam produzidos, ou substituem os hormônios naturais ou ainda provocam o aumento ou diminuição de hormônios naturais. Isso irá desencadear respostas negativas no organismo, muitas delas relacionadas à reprodução.

Para refletir....


A maneira descontrolada de utilização das substâncias químicas em nosso país, na tentativa de se obter os melhores lucros em pouco tempo e principalmente sem preocupação com os problemas futuros que isso a  venha causar, pode gerar problemas de gravíssimas conseqüências para a saúde pública e na manutenção do equilíbrio ecológico, uma vez que o uso excessivo dos inseticidas, por exemplo, venha a promover uma seleção artificial dos insetos.
Faz-se necessário a maior divulgação desse assunto, pois em muitos casos, o uso inadequado dessas substâncias químicas é realizado pela falta de informações e consequente falta de interesse das mídias em divulgá-las. É preciso também que haja uma maior fiscalização nas grandes produções agrícolas e instrução necessária aos pequenos agricultores.
As pessoas precisam entender que a obtenção de dinheiro de forma menos trabalhosa, em curto prazo parece ser bom, porém o feitiço pode se voltar contra o feiticeiro e você acabar colocando em sua mesa uma refeição totalmente contaminada pelos produtos que você mesmo utilizou em suas plantações, o que provocará doenças e fará perder tudo o que foi conquistado... inclusive a vida.
“A mesa mata mais gente do que as guerras.” Joseph de Maistre


Referências:

 GULLAN, P. J.; CRANSTON, P. S; MCINNES, K. Hansen. Os insetos: um resumo de entomologia. 3.ed São Paulo, SP: Roca, 2008. 440 p. ISBN 9788572417020 
http://www.insecta.ufv.br/
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/trabalhador/pdf/texto_disruptores.pdf